Depois do Carnaval

Bem, o Carnaval acabou (exceto na Bahia)! A cidade lentamente volta à sua rotina que deverá ser interrompida daqui há alguns meses quando começar a Copa do Mundo. Ah! E depois tem eleição! Não, este ano não teremos uma rotina comum.
Alguém teve a "brilhante" ideia de marcar a semi-final da Taça Guanabara entre Flamengo e Botafogo para hoje, quarta-feira de cinzas. Já pensou que loucura que vai ficar a cidade? Afinal, hoje também é o dia em que são apurados os resultados do desfile das Escolas de Samba.










A grande pergunta daqueles que gostam de futebol por aqui é: E o que sobrou do Império do Amor depois do Carnaval?

Lembrança de um ato delinquente, porém produtivo

Desde criança convivo com livros. Muito pequena me encantei com a estante cheia de livros na casa da Tia Zezé. Aliás, Tia Zezé não me deixava manusear os livros pois não eram "de criança." Mais tarde compreendi o que ela queria dizer com isso. O fascínio só aumentou ao longo do tempo.
Minha mãe me comprava livros com fábulas e contos de fadas. Em muitas noites eu ouvi a história de um pequeno livro entitulado A Galinha Ruiva. Acho que até hoje sei contar toda a história do livro, mas não vou contá-la aqui embora a moral da história seja relevante: "quem não trabalha, não come".
O meu pai foi quem me ensinou de fato a ler. Tenho a doce lembrança de sentar em seu colo para lermos juntos os gibis da Turma da Mônica e da Luluzinha que ele sempre trazia quando ia até o Rio de Janeiro. Assim, cheguei à escola já com o processo de alfabetização e letramento bem desenvolvido.
A biblioteca da escola - como não poderia deixar de ser - era o meu luigar favorito. Aproveitava cada minutinho do recreio ali dentro. Sabia quando chegavam livros novos. Descobri autores e gêneros literários. E, numa dessas minhas idas à biblioteca escolar, localizei meio ao acaso um livro bem velhinho, com a capa caindo, colado com durex e peguei. Comecei a folheá-lo com desdém em pé mesmo, afinal não havia nele nenhum atrativo físico. Notei que era uma coletânea de poemas de Augusto Frederico Schmidt. De quem? Nunca tinha ouvido falar nele. Percebi que havia algo de intimista naqueles poemas que faziam a tristeza, a separação e a morte ficarem muito belas. A poesia de Schmidt estava repleta de uma nostalgia que eu, adolescente que era, não entendia mas sentia. A cada poema, uma nova emoção. Foi aí que, sem pudor e sem temer punições, coloquei o livro dentro da mochila e o furtei egoistamente. Até hoje é este livro que me ajuda a desafogar as mágoas...



Compreensão

Eu te direi as grandes palavras,
As que parecem sopradas de cima.
Eu te direi as grandes palavras,
As que conjugam com as grandes verdades,
E saem do sentimento mais fundo,
Como os animais marinhos das águas lúcidas.
Eu te direi a minha compreensão do teu ser,
E sentirei que te transfiguras a ti mesmo revelada.
E sentirei que te libertei da solidão
Porque desci ao teu ser múltiplo e sensível.
Quero descer às tuas regiões mais desconhecidas
Porque és minha Pátria
As tuas paisagens são as da minha saudade.
Quero descer ao teu coração como se descesse ao mar,
Quero chegar à tua verdade que está sobre as águas.
Quero olhar o teu pensamento que está sobre as águas
E é azul
Como este céu cortado pelas aves,
Como este céu limpo e mais fundo que o mar.
Quero descer a ti e ouvir
As tuas manhãs acordadas pelos galos.
Quero ver a tua tarde banhada de róseo como nuvens frágeis tangidas pelo ventos
Quero assistir à tua noite e ao sacrifício dos teus martírios.
Oh! estrela, oh! música,
Oh! tempo, espaço meu!

Augusto Frederico Schmidt
(1906-1965)
Topo